Posição Prona na Síndrome da Angústia Respiratória Aguda (SARA): após muitas voltas, demonstra-se enfim, impacto importante na sobrevida.



Última atualização: Terça, 18 de Setembro de 2018, as 17:15

Por décadas a posição prona tem sido utilizada na SARA. Assim como a PEEP, esta intervenção melhora a oxigenação, diminui e redistribui as zonas de colapso alveolar, favorece a maior equilíbrio da relação ventilação/perfusão pulmonar, torna mais homogênea a distribuição da pressão pleural e experimentalmente, atenua a lesão pulmonar induzida pela ventilação mecânica.

Ora, ante a todos esses benefícios, porque não a utilizamos com mais frequência? Muitas vezes preferem-se medidas extremas de resgate de pacientes com SARA grave utilizando-se manobras de recrutamento com altas pressões sustentadas, inalação de NO (óxido nítrico) ou mesmo instalação de ECMO (circulação extra-corpórea para oxigenação e remoção de CO2). A resposta: Porque vários ensaios clínicos falharam em demonstrar o impacto desta intervenção na sobrevida e porque sua implementação nem sempre é de fácil execução pela equipe da UTI e pode se associar a complicações. A percepção atual é de que a posição prona vinha em franco desuso.

A posição prona voltará a ser utilizada. A evidência que faltava para justificar o emprego da posição prona em pacientes com SARA finalmente foi obtida através do estudo PROSEVA, sigla para “Proning Severe ARDS patients”, publicado no mês de maio no New England Journal of Medicine1.

Guérin et al demonstraram, através de um estudo multicêntrico na França, controlado e randomizado, que a aplicação precoce e prolongada da posição prona, a pacientes com formas graves de SARA, resultou em redução significativa da mortalidade. Os números são robustos. A mortalidade em 28 dias com ventilação prona foi metade (16,0% vs 32,8%, com ventilação supina, p<0,001), um efeito de tratamento praticamente sem precedentes na medicina contemporânea, especialmente nesta síndrome. As curvas de sobrevida se separam dentro de alguns dias após o início da intervenção e o benefício persistiu após o ajuste para a gravidade da doença de base.

Alguns aspectos deste trabalho merecem comentários. Foram incluídos 466 pacientes que formavam um grupo seleto de pacientes com SARA grave (PaO2/FIO2<150), que foram inicialmente considerados potencialmente elegíveis. Uma porção significativa de pacientes foi excluída por apresentar melhora do índice de oxigenação em um período de 12 a 24 horas de estabilização. Como ponto forte do estudo, os dois grupos receberam estratégia ventilatória protetora, com baixos volumes correntes e os critérios para desmame da ventilação mecânica foram previamente definidos.

Vale ressaltar que a experiência prévia dos centros envolvidos com a ventilação prona não pode ser subestimada e a reprodutibilidade na vida real dos resultados obtidos pode ser questionada. Um interessante vídeo demonstrativo foi disponibilizado pelos autores e apresenta o procedimento de pronação em detalhes.

A posição prona foi iniciada dentro de uma hora após a randomização e foi aplicada em 73% do tempo disponível. Os pacientes voltavam a posição supina pelo menos uma vez por dia. Isto contrasta com os ensaios clínicos anteriores em que a posição prona foi aplicada por cerca de 30% do tempo. Este aspecto pode explicar em parte os resultados distintos.

Quais as implicações práticas deste estudo? Sem dúvida, a adoção da posição prona exige trabalho de equipe e uma boa coordenação. Para muitos, esta posição pode parecer antinatural para um paciente intubado, apesar de todos nós a adotarmos quando dormimos ou descansamos. Já na UTI, há sempre o risco de torções e deslocamentos não só do tubo endotraqueal ou da cânula de traqueostomia, mas também de cateteres venosos e arteriais, sondas e drenos em geral. As derivações para monitoração do ECG devem ser reposicionadas na região dorsal. Pode ocorrer edema facial, bem como o desenvolvimento de escaras e lesões na pele da face e porções anteriores do corpo. A necessidade de sedação e de bloqueio neuromuscular pode aumentar nos pacientes pronados.

Posição prona
FIGURA 1. Paciente com SARA em posição prona. Fonte: Marcelo A. Holanda. Arquivo pessoal. UTI respiratória – Hospital de Messejana, Fortaleza, CE.


Veja abaixo algumas dicas sobre o processo de pronação de pacientes com SARA e as principais contra-indicações2.


É provável que a posição prona seja cada vez mais utilizada, sendo imprescindível se considerar que haverá uma curva de aprendizagem, sobretudo nos serviços com pouca experiência no procedimento, o que implica em necessidade de treinamento dos profissionais de terapia intensiva. Os resultados obtidos devem ser analisados a fim de serem comparados com aqueles obtidos por Guérin et al.

Pontos chaves:

- Pela primeira vez foi demonstrado que a posição prona, quando adotada precocemente e por tempo prolongado em pacientes com SARA grave (PaO2/FIO2<150), reduz significativamente a mortalidade.
- O maior desafio para adoção desta estratégia reside na necessidade de equipe motivada e treinada no procedimento e na sua indicação precisa


1. Guérin C et al. Prone Positioning in Severe Acute Respiratory Distress Syndrome N Engl J Med 2013; 368:2159-2168. Acessível em:
http://www.nejm.org/doi/full/10.1056/NEJMoa1214103
2. Roche-Campo F, Aguirre-Bermeo H, Mancebo J. Prone postioning in acute respiratory distress syndrome (ARDS): When and How? Press Med 2011; 40 e585-e594. Acessível em:
http://www.em-consulte.com/article/679009/prone-positioning-in-acute-respiratory-distress-sy

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