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Clube de Revista: How I Teach: Heart–Lung Interactions during Mechanical Ventilation. Positive Pressure and the Right Ventricle

Por: BETINA SANTOS TOMAZ, FISIOTERAPEUTA - 09/06/2025 11:57

🫁 Interações Coração–Pulmão sob Ventilação com Pressão Positiva: foco no ventrículo direito

A ventilação com pressão positiva (PPV) tem potencial para provocar deterioração hemodinâmica, especialmente em pacientes com disfunção do ventrículo direito (VD). Embora esse fenômeno seja fisiologicamente relevante e clinicamente frequente, as interações coração-pulmão seguem sendo um tema de difícil compreensão e cercado por conceitos imprecisos, tanto entre profissionais em formação quanto entre clínicos experientes.

No artigo “How I Teach: Heart–Lung Interactions during Mechanical Ventilation. Positive Pressure and the Right Ventricle”, publicado na ATS Scholar (Yuriditsky et al., 2024), os autores propõem uma estrutura didática eficaz para o ensino desses conceitos, com foco específico nos efeitos da PPV sobre o enchimento (pré-carga) e o esvaziamento (pós-carga) do VD.

A abordagem é dividida em duas sessões independentes de 30 minutos:


1️⃣ Como o ventrículo direito se enche

Nesta primeira parte, o foco é a fisiologia do retorno venoso (VR) e os determinantes da pré-carga do VD. O conceito clássico de que a pressão venosa central (PVC) representa a pré-carga é contestado à luz da fisiologia de Guyton, com destaque para a fórmula:

VR = (MSFP – PRA) / resistência

Onde:

  • MSFP: pressão média de enchimento sistêmico

  • PRA: pressão auricular direita

  • Resistência venosa: modulada por compressão externa (pressão pleural, abdominal, etc.)

São utilizados modelos visuais e analogias hidráulicas (como a analogia das colunas d’água) para ilustrar que a diminuição da PRA ou o aumento da MSFP favorecem o enchimento do VD. A pressão transmural (PTM) é apresentada como conceito central, especialmente para compreender o efeito da inspiração espontânea (que aumenta a PTM) versus a pressão positiva (que a reduz).

Figura 1- Representação visual do modelo de Guyton para o retorno venoso. Os dois recipientes com água conectados por um tubo simbolizam o sistema venoso e o átrio direito. A água flui do recipiente com maior altura (maior pressão) para o de menor, ilustrando que:

  • O retorno venoso depende do gradiente entre a pressão média sistêmica de enchimento e a pressão atrial direita.

  • Aumento da PRA (como ocorre com a ventilação com pressão positiva) reduz esse gradiente e o fluxo venoso.

  • Redução da PRA ou aumento da MSFP favorecem o retorno venoso e o enchimento do VD.

  • O estreitamento do tubo representa aumento da resistência venosa, que também reduz o fluxo, mesmo com gradiente preservado.

Essa analogia ajuda a compreender por que a PVC elevada pode não refletir volume adequado, e reforça a importância de avaliar a dinâmica do sistema venoso no contexto da ventilação mecânica.

Além disso, discute-se como a PPV pode aumentar a resistência ao retorno venoso, por colapso de vasos torácicos (e.g., veia cava superior e circulação hepática), e como isso se traduz em alterações na variação da pressão de pulso (PPV) observadas na prática clínica.


2️⃣ Como o ventrículo direito se esvazia

A segunda sessão concentra-se nos efeitos da PPV sobre a pós-carga do VD, destacando que o VD é extremamente sensível a aumentos súbitos da resistência vascular pulmonar (RVP). Os autores introduzem a clássica curva em J que relaciona volume pulmonar e RVP, explicando que:

  • Alvéolos hiperinsuflados comprimem vasos intra-alveolares → aumentam RVP

  • Atelectasia colapsa vasos extra-alveolares → também aumenta RVP

  • A menor RVP ocorre em volumes pulmonares intermediários

Este equilíbrio é fundamental para guiar o uso de PEEP em pacientes com VD disfuncionante, evitando tanto hiperdistensão alveolar quanto colapso. Também se discute a interdependência ventricular paralela, onde a dilatação do VD comprime o VE por deslocamento do septo interventricular, agravando a disfunção hemodinâmica.

Figura 4 – Relação em J entre volume pulmonar e resistência vascular pulmonar.


🧪 Aplicações clínicas discutidas

  • Casos simulados de pacientes com sepse, SDRA e VD dilatado sob uso de noradrenalina.

  • Discussão crítica sobre a variação da pressão de pulso (PPV) como preditor de responsividade volêmica, incluindo:

    • Falsos positivos: complacência torácica reduzida, esforço respiratório

    • Falsos negativos: complacência pulmonar reduzida, baixo Vt

  • Abordagem prática para intubação em pacientes com falência de VD, destacando os riscos da anestesia e da transição para PPV.

  • Reflexão sobre quando a diurese pode ser mais benéfica que o volume em pacientes com dilatação severa do VD.


Conclusão

O artigo traz não apenas uma revisão fisiológica precisa, mas uma proposta pedagógica sólida que pode ser implementada na formação de residentes e intensivistas. Ao dividir o tema em dois eixos independentes (enchimento e esvaziamento), os autores facilitam a assimilação progressiva de conceitos complexos, com grande aplicabilidade clínica em pacientes graves sob ventilação mecânica.

📎 Acesse o artigo completo (open access): https://doi.org/10.34197/ats-scholar.2024-0059HT



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